
Um dia eu li em algum lugar que “envelhecer é encher sem fim os tonéis de saudade”. Lembro que na época eu gostei muito da frase. Confesso que mais pelo efeito que pelo entendimento. Agora, faltando algumas horas para que eu, de repente, acorde com vinte e seis anos (ai, chega a dar medo!), esse conceito me cai como uma luva. Venho pensado muito na minha vida, ultimamente. Fazendo aqueles balanços típicos de fim de ciclos, analisando as perdas e ganhos, planejando o próximo ano, prometendo coisas a mim mesma. Pensar, pensar, pensar e pensar. De súbito, percebi que deveria deixar de tentar racionalizar tanto e me deixar simplesmente sentir. Foi quando eu senti que eu estava, de fato, “transbordando de saudade”. Não a saudade das pessoas que passaram pela minha vida e me deixaram marcas – algumas profundas e outras nem tanto-, mas uma falta de mim. Sinto saudade da ingenuidade que me acompanhou durante tantos anos e me fazia acreditar, sem nem pestanejar, em um mero desconhecido. Onde está aquele contentamento infantil aprendido com a pequena Polyana? Ou mesmo o romantismo incorrigível que me fazia acreditar no príncipe encantado e no amor eterno? Por onde deixei a confiança quase suicida de me entregar sem reservas às pessoas? E a coragem inocente de dizer tudo o que o coração sentia, sem medo de me expor ou de me despir de qualquer armadura? Que saudade de mim, do que eu quis ser e não fui! Uma saudade que o tempo nos deixa. Envelhecer traz consigo a sabedoria de conseguir enxergar além das máscaras das pessoas, de perceber os perigos e nos fazer proteger do que, invariavelmente, nos fará mal. Sofrer é inevitável, mas tudo o que pudermos fazer para diminuir a dor a gente faz. Amar é nossa missão, principalmente, quando o amor é pra gente mesmo. Então, essa saudade tem um gosto amargo doce. Aquilo que nos faz querer voltar a ser o que era e, ao mesmo tempo, perceber que o que ficou também não é ruim... que ser mais realista é necessário. Talvez, no próximo ano, terei saudades de outras coisas de mim. Por enquanto, essa saudade me inunda e me faz transbordar.